tá, mas e daí?

E é essa pergunta que eu mais escutei na minha primeira consulta com o psiquiatra: "tá, mas e daí? Qual o problema nisso?".



Recentemente pedi para minha psicóloga uma consulta com um psiquiatra para ele fazer uma avaliação minha, e para eu saber se várias coisas que estavam me incomodando eram apenas relacionadas a ansiedade mesmo. Na minha cabeça não tinha como ter relação com a ansiedade. Spoiler: sim, tem, muito. Além da ansiedade (que eu já tenho diagnóstico há anos) ele falou que tenho um pouco de TOC e baixa autoestima. Realmente muita coisa fez sentido e, pode ser de fato baixa autoestima.

Bem, o ponto não é esse. Muitas das coisas que eu falava ali, ele insistentemente me questionava "tá, mas e daí? Qual o problema nisso?" e eu não sabia como responder na maioria das vezes. Mesmo eu não gostando do tom ao qual ele fazia essas perguntas, reconheço que essa pergunta me causou uma certa curiosidade sobre a minha listinha de incômodos que eu apresentei a psicóloga e, posteriormente, ao psiquiatra.

Apresentando um contexto aqui: por 21 anos da minha vida, morei com minha mãe (e quase metade desse tempo, minha tia morou conosco). Sempre vejo o meu passado rodeado de mulheres e com diversas personalidades. E eu, muito apegada a minha mãe, sempre considerei ela como minha melhor amiga. É uma relação incrível.

Já fora de casa, eu sempre tive pouquíssimos amigos. Todos eles no ambiente escolar, afinal eu não saía muito, então meu círculo social se restringia a escola e, poucas vezes, a rua de casa. Mesmo tendo amigos na escola, nem sempre eram os mesmos assuntos ao qual eu gostava.

Então, diversas experiências que eram comuns entre amigos: conhecer um restaurante legal, passear no shopping, ir a praia, etc... Eu tive com minha mãe. Por muitos anos (e acredito que até hoje) eu ainda não consigo entender muito bem como funciona sair com amigos. Mesmo durante a faculdade eu tendo essas experiências, era ainda na minha zona de conforto. Meus amigos tinham outros amigos. Já eu, só tinha esses amigos e mais nenhum. Mais uma vez se restringia a faculdade, ambiente escolar.

Ano passado eu me mudei pra São Paulo. Já comentei aqui sobre quais eram as minhas expectativas com essa mudança. Sinto que a adaptação não foi muito complicada, em parte porquê eu não tinha expectativas muito altas, e em parte por eu ter uma rede de apoio, que me possibilitou uma mudança tranquila, morar num ambiente tranquilo, dentre diversas outras coisas.

Eu não vim morar sozinha, dividi casa com outras pessoas e ainda divido. Um dia, quero sim ter meu próprio cantinho, decorado do jeito que eu quero e na minha própria rotina. Meu sonho de morar é da vontade fazer as coisas que quero fazer a hora eu quiser, mas não é simplesmente por isso. É porque hoje entendo a minha rotina, o meu ritmo. E a vontade de morar só é para estar em um ambiente e fazer as coisas no meu ritmo de acordo com a minha rotina. E esse entendimento que tenho hoje sobre morar só, foi por que eu passei a me entender melhor dentro desse contexto dividindo a casa com outras pessoas.

E essa falta de interação mais profunda com outras pessoas (muito disso culpa da timidez e ansiedade) me limitou a muitas coisas. Eu nunca tive uma briga com alguém, sempre fui a menina quietinha, algumas vezes a aluna esforçada, a pessoa que é muito organizada. Mas eu não me sentia assim, uma pessoa organizada e muito menos aluna esforçada. Ainda não sei o porquê, mas isso, de alguma forma, me fez buscar a continuar agindo dessa maneira: ser sempre a menina perfeita e sempre muito calada.

Se essa era uma imagem minha das expectativas das pessoas, eu não faço a menor ideia. Eu não tenho como saber o que os outros pensam, eu sei disso, e tenho que me lembrar disso constantemente.

Por essa busca de tentar ser perfeita e a pessoa que nunca cria conflitos e nem está inserida neles, acabei me incomodando com muita coisa:

- por que que eu tenho manias com comidas?
- por que sou muito tímida falando com pessoas?
- por que sou metódica?
- por que não consigo olhar nos olhos?
- por que é mais fácil me comunicar pela escrita?
- por que sons altos me incomodam?
- por que isso, por quê aquilo?

E sempre que lembro das coisas que me incomodam, lembro do psiquiatra me questionando: "tá, mas e daí? Qual o problema nisso?". E foi aí que eu tive um insight, minha mente parou e eu perguntei para mim mesma: 
"Qual o problema nisso?". Dei um sorriso e até entendi na hora a pergunta.
Eu nunca fui o tipo de pessoa que sabia me descrever, até hoje não sei, mas um dia chegamos lá. Eu não sabia quem eu era. Nessa busca incessante de ser, falar, agir se preocupando demais com o que os outros pensam, eu acabei não dando atenção a uma coisa: qual é o meu jeito de ser?

Eu observa as outras pessoas e sempre via o jeitinho delas de ser. Elas eram daquele jeito porque era da personalidade dela, era simplesmente assim. Mas e eu? Qual era o meu jeito? Quem era eu no meio dessa busca de ser o que os outros pensam quem eu sou? Eu não sabia, e continuo não sabendo.

Muitas das coisas que as pessoas achavam estranho, eu simplesmente colocava isso num lugar de "isso é errado, não pode ser assim" e ia mudando, moldando quem eu era e que eu sou baseado na aprovação dos outros.

Mas agora eu entendo que todas (ou quase) aquelas coisas que eu me incomodo tanto, não seria algo que é apenas o meu jeito de ser? Por anos, tudo isso não sou eu quem me incomodava, eram os outros que se incomodavam. A maioria, não afetava negativamente os outros, muito provável nem afetava positivamente. Era algo que tanto faz. Não fazia diferença.

E aí torno a me questionar "qual o problema nisso?".

É o meu jeito e eu estou descobrindo isso. É o que chamam de autoconhecimento? Às vezes ficamos surpresos com o que descobrimos sobre nós mesmos. No meu caso, uma baita surpresa de que apenas sou assim.

Foto de Denys Nevozhai no Unsplash

0 comments